terça-feira, 15 de julho de 2014

Ensinando uma criança bilíngue a escrever nas duas línguas.

Antes de começar, gostaria de agradecer ao Breno pelo comentário que gerou este post (e parabeniza-lo pela gravidez!).

Em seguida, aviso que os comentários a seguir são uma mistura de pesquisa com opinião. Meus filhos, devido às suas idades (1 ano / 2 anos) ainda não leem. Portanto, não tenho muita ‘prática’ no assunto. Rs

A primeira coisa a ser considerada acerca de crianças bilíngues é: “Qual o seu objetivo ao criar seu filho bilíngue?”. Às vezes, saber falar e entender o idioma já atinge o objetivo estabelecido. Em outros casos, a família espera uma criança alfabetizada nos dois idiomas.

A partir da resposta acima, os pais podem traçar metas e estratégias para alcança-las.

Vou responder os questionamentos dele aqui para esclarecer um a um.

Como vou fazer meu filho escrever em inglês?”

O processo de escrever sempre vem depois do processo de leitura. O primeiro passo, então, é familiarizá-lo com o idioma escrito por meio da leitura. Depois de familiarizado com a leitura (fase passiva), a criança está pronta para começar na escrita (fase ativa).

Como tudo no mundo do bilinguismo, não existe resposta pronta ou solução ideal para o caso. A partir de alguns relatos e textos, verifiquei que é mais comum ensinar a escrever em um idioma primeiro, para então iniciar o segundo. Algumas escolas bilíngues de São Paulo usam esse método, introduzindo a escrita na segunda língua um ano depois da primeira.

Isso se mostrou mais verdadeiro quando os alfabetos são os mesmo (inglês-português, por ex.) do que em casos de alfabetos distintos (japonês-português). Nos casos de alfabetos diferentes, o ensino simultâneo não parece confundir a criança.

Para muitas famílias ao redor do mundo, o que ocorre é o seguinte: a escola fica incumbida do ensino de um idioma, e a família se encarrega do outro.

Para muitas línguas, entidades governamentais e ONGs disponibilizam diversos materiais gratuitos (download) para ajudar os pais a alfabetizar seus filhos. [disponibilizei alguns links aqui]

A família pode escolher entre alguns métodos para garantir que seus filhos sejam alfabetizados nas duas línguas:

- Deixar a alfabetização nas duas línguas a cargo de uma escola bilíngue;
- Deixar a escola responsável por um idioma e ensinar o outro em casa; ou
- Deixar a escola responsável por um idioma e outra escola (sejam cursos de idioma ou escolas estrangeiras via Educação à Distância) encarregada do outro.

Pois sabemos que a relação fonema e letra é bem diferente entre português e inglês. Isso não irá causar estranheza?

A relação fonema letra entre essas duas línguas é bem diferente. O português é uma língua mais estruturada e mais ‘pura’, por se tratar de uma língua latina (originária do latim). Seus fonemas são mais rígidos, i.e., não é comum uma mesma vogal ou sílaba ser pronunciada de forma diferente em palavras diversas.

O inglês é uma língua anglo-saxã, cuja origem remonta aos antigos idiomas germânicos. A partir daí, com a invasão da Inglaterra e a proximidade com os demais países europeus, o idioma foi se alterando, absorvendo uma quantidade enorme de termos estrangeiros. Como resultado, existem palavras em inglês que mantém uma pronuncia germânica, enquanto outras possuem pronuncias latinas (dentre outras).

Para exemplificar:

Kindergarten [kin-der-gahr-tn, -dn] /ˈkɪnDescrição: http://static.sfdict.com/dictstatic/dictionary/graphics/luna/thinsp.pngdərˌgɑrDescrição: http://static.sfdict.com/dictstatic/dictionary/graphics/luna/thinsp.pngtn, -dn/ - pré-escola. Origem germânica. (Pronuncia: “KINDergarden”)
Kind [kahynd] /kaɪnd/ - Bom, gentil, amável. Origem inglês antigo. (Pronuncia: “KAIND”)

Ou ainda Utter [uht-er] e Utopia [yoo-toh-pee-uh]. O mesmo U tem duas pronuncias bem distintas.

Apesar dessa diferença de pronuncias no idioma inglês, os americanos conseguem ler e escrever tranquilamente. A diferença é que um brasileiro alfabetizado (conhecedor das regras gramaticais) consegue pronunciar qualquer palavra que ele encontre, mesmo que ele não saiba o significado da mesma e nunca a tenha visto antes. Um americano, por sua vez, não conseguirá pronunciar corretamente uma palavra que ele não saiba a origem, significado ou que ele não tenha ouvido antes. (Existe um teste curioso que evidencia isso nesse link).

Saber que os americanos conseguem ser alfabetizados, mesmo com essas divergências, é bem reconfortante para nós. =)

Devemos lembrar também que crianças são esponjas de conhecimento. Existem palavras que são similares, mas possuem pronuncias diversas entre português e inglês. Por exemplo: toilet/toalete, manual, federal, utopia etc.

Sabendo que existem divergências na língua falada, e que elas não confundem ou atrapalham o desenvolvimento das crianças bilíngues, podemos afirmar com certeza que divergências fonéticas não irão causar nenhum impacto negativo em nossos filhos.

Acredito que foi devido a essas diferenças que a escolha mais comum tem sido ensinar um idioma de cada vez.

 “Não irá prejudicar seu rendimento escolar na disciplina de português?”
                                 
Fique tranquilo. Estudos indicam que o desempenho acadêmico de crianças bilíngues é quase sempre superior ao de crianças monolíngues. Isso pode ter algumas explicações, mas a mais aceita é que crianças bilíngues possuem uma melhor compreensão da estrutura das línguas.

Conclusão

Diante de todo o exposto, o caminho a ser seguido por famílias bilíngues para conseguir fazer seus filhos lerem e escreverem é o mesmo de família monolíngues. A leitura deve ser incentivada, desde cedo.

[Não vejo óbice em continuar lendo livros com a criança em um idioma enquanto ela é alfabetizada no outro. Eu faço isso e recomendo, pois além de ser um tempo de qualidade com a criança, livros são ricos em vocabulário.]

Aqui cabe um breve aviso, na hora de incentivar seu filho a ler, escolha livros para a faixa etária dele, com vocabulário novo, mas dentro de sua capacidade de compreensão. Uma criança estimulada com livros desafiadores vai virar uma grande leitora, mas uma que tropece e tenha dificuldades em compreender aquilo que lê pode fugir dos livros. Devemos encorajar novas descobertas, desde que elas estejam dentro da capacidade da criança, senão corremos o risco de frustrá-la.

[Dica: livrarias grandes costumam ter livros em outros idiomas, mas para um acervo mais amplo, recomendo a loja TheBookDepository, eles possuem diversos títulos infantis e entregam com frete grátis no mundo inteiro.]

Um grande abraço,


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