A afirmação do título pode
parecer contraditória, mas permita-me explica-la.
Em diversas ocasiões,
perguntaram-me como eu estava ‘ensinando’ inglês para meus filhos. Em muitos
casos, a ideia de quem me perguntava isso era de que eu ensinava a ela da mesma
forma que as escolas de inglês fazem: sentando-a em uma cadeira e começando a
falar “em inglês, a cor vermelha se chama red.
Red. Então, para falar maçã vermelha,
falamos red apple”.
Essa é uma boa forma de ensinar
um idioma, mas não funciona com crianças muito pequenas e não tem nada a ver
com uma criação bilíngue.
Um filho bilíngue aprende as duas
línguas da mesma forma. Isso significa que não se usa um idioma como
instrumento para ensinar o outro. A criança está aprendendo a decifrar o mundo,
e seu conhecimento ao nascer é [praticamente]
o mesmo em qualquer língua (nulo).
Por isso, seu aprendizado da
segunda língua deverá ocorrer de forma natural e interativa. A criança deve
aprender experimentando, convivendo e interagindo com o idioma. Se a criança
nunca viu um liquidificador, ela não lhe atribuiu nenhum nome ainda, em nenhuma
língua. Ao ver um pela primeira vez, recebe a informação de que “that’s a blender”. Agora a criança já
atribuiu um nome ao objeto (Blender).
Se uma semana depois, recebe a
seguinte informação “isso é um liquidificador”, a criança vai entender que ‘liquidificador’
é outra forma de falar ‘blender’.
Em todos os idiomas que conheço,
existem sinônimos. Palavras diferentes para significar a mesma coisa ou coisas
muito parecidas. Temos diversos exemplos em português:
Montanha, morro, colina, monte.
// Mar, oceano, pélago. // Carro, automóvel, veículo.
O mesmo ocorre em inglês:
Mountain, cliff, mount, hill. // Sea, ocean. //
Car, automobile, vehicle.
Apesar de existirem leves
diferenças entre o uso das palavras citadas, podemos considera-las como
sinônimas. Ninguém deixará de ser compreendido se usar o termo oceano no lugar
de mar. Diante disso, vemos que é natural
às crianças (e aos adultos) atribuírem mais de um nome a um mesmo objeto.
Agora que já sabemos que não
existe problema em saber dois nomes para o mesmo objeto, gostaria de fazer um
alerta sobre a criação de uma criança bilíngue:
É normal que a criança bilíngue
tenha um idioma dominante, que será aquele que ela falará mais. É normal,
também, que o idioma dominante se altere com o tempo, ora um ora outro. É
importante para os pais respeitar essa escolha, mas nunca abrir mão do idioma
‘secundário’. Em uma criação OPOL onde a mãe fica em casa, é normal que a
criança desenvolva um vocabulário maior no idioma da mãe devido ao convívio. O
pai, então, pode se deparar com situações onde a criança sabe a palavra apenas
no idioma da mãe. Nessa situação, é importantíssimo que o pai não traduza para
o idioma da mãe.
Vou dar um exemplo para explicar.
Uma família OPOL onde o pai fala inglês e a mãe português (qualquer semelhança
com a situação de quem vos escreve não é mera coincidência rs). Todos os dias,
a mãe é a responsável pelo banho. Ela pede pra seu filho “entre na banheira,
por favor”. O filho já sabe o que é a banheira.
Imaginem que a mãe peça para o
pai dar o banho um dia, e ele prontamente o faz. Ele então pede ao filho “can you get in the bathtube,
please?”. O filho não conhece a palavra bathtube, então o pai tem
algumas possibilidades. Ele pode apontar e mostrar para o filho o que é
bathtube (banheira). Ao ver seu pai apontando para a banheira, a criança irá
entender que ambas as palavras se referem ao mesmo objeto.
Caso o pai tenha recebido outra
tarefa, também relacionada à hora do banho, como comprar uma banheira maior. O
pai, já na loja, fala para o filho que “we’re going to buy you a new and bigger
bathtube”. Dependendo da idade, o filho vai perguntar para o pai “o que
é isso?”. Crianças pequenas vão fazer uma cara de interrogação apenas. Nesses
casos, o pai explica para o filho o que é uma bathtube. “It’s where we put water to clean you up. Mommy
usually does it.”
Por que o pai não deve simplesmente falar “bathtube is a banheira”?
Dar a palavra em português, nesse
caso, reforçaria a ideia de que o português é o idioma base, enquanto o inglês
é o acessório. Ao se criar uma criança bilíngue, esse tipo de raciocínio deve
ser evitado ao máximo. Uma língua não pode pesar mais do que a outra. Ambas
devem ter o mesmo peso na vida da criança.
Ainda, em uma situação OPOL onde
aquele pai que fala a língua minoritária entende a língua majoritária, ou em
uma situação ML@H onde os pais entendem a língua majoritária, a criança pode
deduzir que o esforço para utilizar a língua minoritária não compensa.
Algo do tipo: “Se eles também
falam português, pra que eu vou me dedicar para falar inglês?”.
Mesmo com esse cuidado, isso pode
acontecer. O importante é se manter irredutível. Mesmo que a criança se recuse
a falar um idioma, ela ainda irá conviver com ele. Ela terá o que chamamos de
fluência passiva. Transformar a fluência passiva (ouvir) em ativa (falar) é
muito mais fácil do que ensinar a língua do zero. Então, mesmo que seu filho se
recuse a falar o idioma, vale a pena insistir e “ensinar” a outra língua para
ela. Acredite, o bilinguismo é um enorme presente que você dará para seus
filhos!
Um grande abraço,
Olá Marcelo!
ResponderExcluirFiquei uns meses sem dar uma checada aqui e vi que seu blog decolou ein! Parabéns! Vou ler o material todo com calma. Grande abraço.
Amei o blog!! Parabens !!
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